terça-feira, 13 de dezembro de 2011

JOÃO BATISTA JULIÃO - Um Mestre que merece ser lembrado

Em 1986, o Boletim nr 3 da Sociedade Brasileira de Musicologia publicou trabalhos a propósito do centenário de nascimento do ilustre mestre paulista,João Batista Julião, figura importante no cenário musical brasileiro.

As notícias biográficas a seu respeito, constantes do Boletim mencionado, foram disponibilizadas por sua filha, Profa. Maria de Lourdes Julião, a partir de um manuscrito provavelmente de seu próprio punho. Segundo essas Notícias Biográficas, João Batista Julião nasceu no dia 1º. de setembro de 1886, em Silveiras, SP, onde cursou as primeiras letras e aprendeu a tocar diversos instrumentos na banda da cidade. Em 1904 mudou-se para Moji das Cruzes,e logo tornou-se regente da Corporação Musical União Mojiana. Na mesma época, e já casado com a Sra. Profa. Maria de Lourdes Freitas, escreveu revistas, dedicou-se ao coro da Igreja Matriz e produziu muitas obras para banda.

Em 1914 matriculou-se no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, onde graduou-se em Contraponto e Fuga em 1918. Ao mesmo tempo, estudou particularmente com o Maestro Savino De Benedictis, com o qual manteve por toda a vida uma grande amizade, tornando-se em 1924 padrinho de batismo de Lydia, filha do casal Savino / Carmelita.

Em 1915 fundou um instituto musical em Moji das Cruzes e em 1918, mediante concurso, foi nomeado mestre de capela da Matriz, cargo que exerceu até 1926. Nesse ínterim, foi professor de música da Penitenciária Modelo do Estado, na Escola Normal Padre Anchieta e outros estabelecimentos de ensino. Em 1927 fundou o Instituto Musical de São Paulo, que permaneceu dirigindo até 1961, quando faleceu.

Embora já tivesse realizado diversos trabalhos em relação ao Canto Orfeônico, em 1942, quando foi instalado no Rio de Janeiro o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, foi um de seus primeiros alunos, e com a habilitação necessária já recebida, anexou, em 1943,o Conservatório de Canto Orfeônico ao Instituto Musical de São Paulo. A partir de então, dedicou-se a preparar e orientar cursos para formação de professores de Canto Orfeônico no Estado de São Paulo, culminando com o cargo de Orientador-Chefe do Ensino de Canto Orfeônico neste estado, recebido em 1957.

João Batista Julião ocupou a cadeira nr 37 da Academia Brasileira de Música e exerceu inúmeros cargos de diretor e Presidente em entidades musicais. Foi também compositor e autor de inúmeras obras didáticas.

O cinqüentenário de seu falecimento, que se deu neste ano (1961-2011) vem encontrar o ensino da música nas escolas em uma situação caótica, pois que a lei determina a criação dos cursos sem que haja professores especializados. Rever os programas e as obras criados especialmente para a mesma finalidade pode e deveria ser um caminho, pois que seguiam metodologia que deu bons resultados em seu tempo. E esse tempo não é tanto assim que se possa considerá-los superados – ainda mais que, nesse vácuo, não surgiram mestres como João Batista Julião e seus contemporâneos...

terça-feira, 29 de novembro de 2011

AO NORTE DO HORIZONTE - O EXÍLIO COMO TEMA LITERÁRIO

AO NORTE DO HORIZONTE, romance de Branca Ferrari (São Paulo, Biblos Editora, 2011) retoma um tema que vem sendo visitado há cerca de quarenta anos e que parece estar longe de se extinguir: o de uma juventude que tem o futuro despedaçado por ditaduras e repressão policial. Neste caso, é uma juventude que se reúne em Paris, dedica-se aos estudos universitários e ao mesmo tempo tenta socorrer as vítimas de seus países.

O pano de fundo de toda a ação é o romance entre uma brasileira e um alemão.Este, se não se mostra decididamente de esquerda, é pelo menos um elemento de resistência ao nazismo que, de forma aberta ou disfarçada, tenta se instaurar novamente em seu país. A narrativa é toda feita em primeira pessoa - do ponto de vista de Vivi, a brasileira - mas a inserção recorrente de várias vozes, de vários personagens, em discurso direto, atenua esta visão e não deixa que ela seja monopolizadora.

A narrativa principal é alternada por diversas outras secundárias, não menos interessantes, como história de Maria Amélia e Luiz, e a de José Maria, um travesti brasileiro, que salva um perseguido da polícia simplesmente transformando-o também em um travesti. Como se vê, o tom geral da narrativa está longe de ser depressivo e até culmina em um final feliz, o que, na vida real, nem sempre foi assim.

Não é no que está escrito, entretanto, que a autora denota sua vivência de militante, mas em certas ausências: os personagens principais, por exemplo, têm nome, mas não sobrenome. Fica para o leitor decidir se aquele prenome é ou não um codinome. A própria narradora, por exemplo, é, durante todo o romance, apenas Vivi ...
Um outro indício da militância está num elemento que coloca a esquerda em um plano altamente romântico: o número de poemas, em espanhol, italiano ou francês, que em diversos momentos, felizes ou infelizes, os personagens declamam. No Brasil, era a música popular esse elemento catalizador de ações. E ainda a infindável sede de leitura de Vivi, a livraria e editora de seu namorado, que revelam o comprometimento teórico da esquerda, embora em nenhum momento os autores dos livros lidos pelos personagens sejam citados.

É altamente positivo que se mantenha o tom de toda a narrativa, pois ele aponta para uma superação de antiga dores e a aceitação das cicatrizes antigas. Talvez seja essa a intenção de Branca Ferrari, na epígrafe escolhida: “Para os navegantes com desejo de vento, a memória é um porto de partida” – Eduardo Galeano.

COMO ADQUIRIR: Através da
www.amazon.com/books (digitar o título em português)

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

PROCURAÇÕES : SIM OU NÃO?

No Condomínio em que habito, vem sendo discutida com certa freqüência, nos últimos tempos, a possibilidade de reduzir o número de procurações para as Assembléias em que são votadas questões de maior ou menor relevância.

Pessoalmente discordo dessa limitação, que não consta nem da Convenção de Condomínio e que não é especificada pelo Código Civil, que legisla sobre a matéria.

A razão desta minha discordância é uma simples hipótese: o vislumbre da possibilidade de manipulação, por parte de grupos que queiram a tomar o poder ou que venham a tomá-lo. As restrições podem ser perigosas, em caso de má-fé, pela possibilidade de manipular os condôminos que em geral dão procurações.
Os condomínios cada vez mais têm população quase que flutuante, de modo que dificilmente podemos conhecer cada vizinho e, muito menos, reconhecer-lhe as qualidade morais e sua probidade como cidadão.

Em realidade, nem sempre as pessoas que delegam seu poder de voto a outrem o fazem por comodismo; as razões podem ser muitas, e vão desde uma opinião pouco clara a respeito de tópicos da pauta – caso em que o condômino delega seu voto a quem ele acha que está mais informado e o representa bem – até motivos de saúde.

Outra realidade que necessariamente deve ser levada em consideração é o envelhecimento da população. Muitos pessoas que não comparecem a reuniões de condomínio não ouvem bem, dormem muito cedo, enfim, têm uma vida restrita pela própria idade. Levá-los a confiar em quem não mereceria confiança pode ser muito fácil. E também muito perigoso, já que todas as manipulações, em geral, apontam para um ponto muito frágil da população: o próprio bolso.

E permitir manipulações em matéria que exige tanta seriedade, em uma economia muito incerta como a nossa, em que o desemprego é um fantasma e aposentadoria, quando há, é passível de altos e baixos, é expor-se a um alto risco – pois, uma vez criada a via da restrição às procurações, revertê-la ou extingui-la é quase impossível.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

100 ANOS DO THEATRO MUNICIPAL DE SÃO PAULO

Algumas palavras sobre a Exposição

Durante quinze dias consecutivos, de 15 a 30 de outubro de 2011, obras de oito artistas plásticos estiveram expostas no Espaço Paulista de Arte. O mote comum era o Teatro Municipal de São Paulo, em seu centenário.
Certamente, as obras foram produzidas em separado, sem que os artistas “combinassem” entre si as abordagens que escolheram. Mas o resultado mostrou inegáveis ilações, não só pelo tema comum, como pela condução dos olhares de pessoas de formações diferentes, em relação a um ícone da cultura paulistana.
Roberto Rossant explorou o tema das máscaras e as silhuetas esbatidas de uma bailarina curvada em agradecimento, com outra bailarina ao fundo, visível apenas em parte. Segundo suas próprias palavras, com as máscaras, volta-se para a origem grega da arte cênica. Já Wagner Aniceto, que se diz um pintor de paisagens urbanas, colocou também bailarinas, flutuando entre a agressividade do concreto da grande cidade.
Marcelo Neves, escultor, deslocou sua Catherine, uma mulher muito gorda em passo de dança, da languidez e fluidez usual das bailarinas. Em outras esculturas, mulheres também obesas se divertem num balanço. Será um alerta para a aceitação da beleza em todas as suas formas? E Catherine, dotada de um mecanismo, gira e gira...
Ferracioli se auto-retrata como Dom Quixote. E entre dois Quixotes coloca uma cena de ópera de Wagner.
“Você acha que o artista, hoje em dia, é quixotesco?”, perguntei. E ele apenas sorriu. Mas não negou.
Marcus Claudio nos mostra, em branco e preto, o que também foi retratado em branco e preto: os anônimos construtores do edifício, em quase totalidade artesãos italianos vindos especialmente para a construção e que aqui ficaram. (Uma bisneta procurava, no quadro, o indício de quem seria seu antepassado...) E o artista recria a chegada, em carroças, dos pianos Pleyel, adquiridos especialmente para a nova casa de espetáculos.
Surpresa! Alguém finalmente lembrou-se do Patrono do Teatro, nosso grande Carlos Gomes. Foi Gladys Maldaun, que retratou de diversos ângulos o compositor e seus principais personagens, representados em esculturas que circundam as escadas que vão para o Vale do Anhangabaú. Preterido na inauguração e no centenário do Teatro Municipal de São Paulo, e freqüentemente na programação anual, Carlos Gomes, na estátua e também nos quadros, parece carregar um peso: “Por que não nasci num país estrangeiro? Seria reconhecido no Brasil!”
Avelino retrata o Teatro por fora, ao anoitecer, com suas luzes, seu esplendor em dias de chuva e em dias de espetáculo. A multidão segue apressada. Talvez vejam, talvez não vejam o Teatro. Pois Avelino sempre o vê, quando passa, todos os dias, vindo do trabalho para sua casa. E lamenta a deterioração de um entorno que deveria merecer mais respeito.
Já Alexandre Reider se fixa nos músicos e, mais particularmente, em um músico: o Maestro Jamil Maluf, regendo a Orquestra Experimental de Repertório, criada por ele há quase vinte anos.
Muitas das pessoas que compareceram à Vernissage, no dia 22 de outubro, permaneceram por mais tempo do que pretendiam, para ver o Maestro, que chegaria em breve. Porque a música de todos os tempos e todos os países está sempre revivida e renovada, na pessoa dos grandes artistas que ocupam o palco diante de nós e especialmente para nós, o público.

domingo, 16 de outubro de 2011

CENTENÁRIO DO TEATRO MUNICIPAL DE SÃO PAULO - NOVOS OLHARES DE OUTROS ARTISTAS

O Espaço Paulista de Arte homenageia o Teatro Municipal de São Paulo em seu centenário, com uma exposição coletiva de artistas contemporâneos, em que “cada um representou, através de sua pintura, bailarinas e músicos que se reúnem em passeio entre os personagens esculpidos do jardim da praça do teatro”, conforme o convite.
São quadros – óleos e aquarelas – e esculturas, dos artistas Alexandre Reider, Avelino, Ferracioli, Gladys Maldaun, Marcelo Neves, Marcus Cláudio, Roberto Rossant e Wagner Aniceto. O teatro é visto através de cenas imaginadas, como a obra de Marcus Claudio com a chegada de pianos Pleyel, em carroças, supostamente na época da inauguração; cenas reais, como a escadaria que leva ao Vale do Anhangabaú, com suas esculturas: Carlos Gomes e seus personagens, por Gladys Maldaun; e, cena não só real, como também atual, do Maestro Jamil Maluf regendo a Orquestra Experimental de Repertório, e alguns de seus músicos, por Alexandre Reider. O prédio em si é lembrado por uma vista parcial de sua fachada, feita por Avelino. Outras obras são bailarinas, máscaras e até um Dom Quixote, de Ferracioli, que lembra o balé de mesmo nome.
O Teatro Municipal de São Paulo, “inaugurado em 12 de setembro de 1911, é considerado um dos ícones de nossa cidade. As reformas físicas e estruturais pelas quais passou a partir de 1952 procuraram dotá-lo de recursos técnicos e administrativos, deixando-o atualizado e inserido num circuito cada vez mais exigente para a realização de espetáculos. Agora, em 2011 - ano de seu centenário, está reformado com tecnologia de ponta, cuidadosamente restaurado e reformulado (...)”, informa Sergio Roberti de Nucci, em transcrição de trecho de seu livro inédito Teatro Municipal de São Paulo – A mágica interface de uma ribalta.
A Exposição em homenagem aos 100 anos do Teatro Municipal de São Paulo estará aberta ao público de 15 a 30 de outubro de 2011, de segunda a sábado, das 10h às 20h. Vernissage dia 22 de outubro de 2011, sábado, das 12h às 18h.

Espaço Paulista de Arte
Rua Francisco Leitão, 190/198, Pinheiros, São Paulo, SP
Fone (11) 3062-0653
www.espacopaulistadearte.com.br

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

CONTOS E CRÔNICAS DO BEXIGA

O bairro Bela Vista comemora neste mês de outubro os 133 anos, ao mesmo tempo em que o país comemora o início do Ano Brasil-Itália. Bairro paulistano famoso por sua população italiana, a Bela Vista – ou Bexiga – ganha como presente de aniversário uma leitura amena e gostosa: Momentos do Passado – Contos e Crônicas do Bexiga. O autor, Rodolpho Civile, nasceu, cresceu e manteve clínica médica no bairro, à Rua Maria José, quase esquina com a Rua Major Diogo. Hoje, aposentado, escreve “para preencher a velhice”...
Apesar de sumamente despretensioso, o Dr. Rodolpho pinta tipos humanos muito verdadeiros e fáceis de reconhecer: o barbeiro, o palhaço do circo, o colchoeiro, relojoeiros, as fofoqueiras (as alegres comadres do Bexiga)... Isto é, diversas profissões em extinção – exceto as fofoqueiras!
Nascido em 1925, graduado em Medicina em 1952 e exercendo a clínica médica durante 25 anos, Dr. Rodolpho presenciou inúmeras mudanças urbanísticas e humanas no bairro: ele se refere aos bondes diversas vezes, dá à atual Praça da Bandeira o nome de Largo do Piques, fala da favela Saracura, do Cine Rex, da Confital e do Hotel Danúbio etc. E cita muitas vezes a tradicional Escola de Samba Vai-vai e seus integrantes, bem como a Igreja de N. Sra. Achiropita, símbolos do bairro.
Quanto aos seres humanos, “procurei colocar no papel indivíduos com características de personalidade que se sobressaíam da coletividade e que me chamaram a atenção”, explica no 6º. capítulo, do total de 30.
Não obstante o fato de serem caracterizados como indivíduos de tempos passados, a uma observação mais próxima e diária podemos notar que, mudadas as exterioridades, em essência muitas daquelas pessoas simples, sobretudo os afro-descendentes, continuam circulando pelas ruas do Bexiga, com os mesmos problemas do passado: falta de oportunidades, pobreza crônica e tudo o que se transmite de geração a geração, entre os deserdados da divisão de riquezas.
Momentos do Passado – Contos e Crônicas do Bexiga é um livro que nos leva a fixar os olhos numa paisagem física e humana peculiar, que se perpetua em sua modéstia e desaparece diante do progresso aparente. Um progresso que não muda muito os fatos – apenas nos faz olhar para o que (supostamente) virá –, deixando de ver o que foi e que continua sendo, revestido de sua conveniente invisibilidade.

Este livro pode ser solicitado pelo cel. (11) 9540-4200, pelo preço de R$.30,00.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

O VOTO FEMININO NO BRASIL

A reivindicação do direito de votar, em alguns países do mundo ocidental, é bastante antiga. Mas como movimento que se organiza data mais ou menos da segunda metade do século XIX. Em 1865 forma-se em Manchester, na Inglaterra, o primeiro grupo de mulheres dispostas a lutar para conquistar este direito. Esta luta fortaleceu-se a partir de 1904 em diante e é nesta época e entre esses grupos que destaca-se a figura de Ethel Smyth, autora da March of the Women, de 1911 (um século atrás!) da qual falamos em texto específico no blog www.mulheres-compositoras.blogspot.com.
No Brasil, em 1873, Francisca Senhorinha da Motta Diniz, editora do jornal O Sexo Feminino na cidade de Campanha, MG, sugeriu que as mulheres pudessem votar em eleições municipais. Após a proclamação da República, o jornal mudou seu nome para O Quinze de Novembro do Sexo Feminino e criou coluna importante em função do sufrágio feminino. Já a editora do jornal A Família, Josefina Álvares de Azevedo, escreveu e fez representar uma peça chamada O Voto Feminino, que se contrapõe à peça de França Júnior, As doutoras, na qual as mulheres são ridicularizadas ao reivindicar acesso a profissões de nível superior e ao voto.
Em 1883, o direito ao voto feminino já contava com organizações nos Estados Unidos. Carrie Chapman Chat, americana, conseguiu em 1902 uma conferência internacional em Washington para debater a questão do voto feminino. A Aliança Internacional pelo Sufrágio da Mulher, organização permanente sugerida nesta ocasião, foi lançada num Congresso em Berlim, em 1904. Esta Aliança começou com apenas 8 associadas e gradativamente foi ganhando mais adeptas. Em 1922, em Baltimore, durante a Primeira Conferência Pan-Americana de Mulheres, uma pessoa de fundamental importância para o movimento sufragista brasileiro apareceu em cena: Bertha Lutz.
Assim que retornou ao Brasil, Bertha Lutz, favoravelmente impressionada sobretudo com a maneira como a luta pelo voto era desenvolvida nos Estados Unidos, transformou a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher, que ela havia criado, na Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. Esta Federação preparou ainda em 1922 um congresso de mulheres, no Rio de Janeiro, que recebeu a visita de Carrie Chapman Chat no mês de dezembro. Homens de destaque apoiaram a iniciativa, como o senador Lauro Muller e nove estados enviaram delegados oficiais, indicados pelos governadores. Foi então criada a Aliança Brasileira pelo Sufrágio Feminino, tendo como presidente a esposa do senador Justo Chermont, autor de um projeto de lei para o sufrágio feminino, em 1919. Depois desta Aliança, várias outras foram se formando ou criando filiais, e várias pessoas e associações deram-lhe apoio.
Ainda em 1922, 170 mulheres aderiram à Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. É fato digno de nota que entre as inscritas, 19 se declararam compositoras, sendo superadas em número apenas pelas encadernadoras. Não se trata aqui, todavia, de compositoras no mesmo sentido que se dá a Dame Ethel Smyth. Mas não se pode duvidar de sua existência, pois antes do advento do rádio – que começa em 1923 – muitas pessoas ganhavam a vida dando aulas de piano e imprimindo partituras de música de dança e de salão, cuja venda era também fonte de renda.
Dez anos depois, em 1932, graças ao esforço envidado por tanta gente e por tanto tempo, a mulher brasileira conquistou seu direito ao voto.

Bibliografia:
HAHNER, June A mulher brasileira e suas lutas sociais e políticas: 1850-1937. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1981.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

NARA – A FORÇA DA DELICADEZA

O show em homenagem a Nara Leão, vinte e dois anos depois que ela nos deixou (7.6.1989), evidencia a imagem que ficou, de uma cantora que foi um dos símbolos de uma geração. Nara é corporificada por uma bela atriz-cantora, Fernanda Couto, que a revela não só pelo repertório, mas também pela voz e pela postura. Uma imagem de delicadeza.

Mas não falta força a tanta delicadeza. Assim como a Nara real, Fernanda Couto – a Nara do palco – perfeitamente entrosada com Guilherme Terra (teclados), William Guedes (violão) e Rodrigo Sanchez (bateria), mostra carisma e presença cênica. E imita perfeitamente bem a maneira simples e despretensiosa de cantar daquela que dá nome ao show.

A ambientação – cenário, figurino e telão – mostra o equilíbrio de uma equipe entrosada e competente, trabalhando em função de um resultado final muito coeso.
Durante uma hora e pouco, pode-se ouvir trechos de músicas emblemáticas do período que vai de 1964 a 1977 – anos duros, anos de chumbo. A direção musical, de Pedro Paulo Bogossian, sublinha a narrativa com precisão e bom gosto. Ouvem-se as músicas da bossa nova, dos festivais, dos shows Pobre menina rica e Opinião. Por este, ela recebeu voz de prisão. Da qual foi salva por um poema de Carlos Drummond de Andrade e uma manifestação de protesto.

O caráter intimista, que é a marca da bossa nova, dá o tom do show Nara. Os músicos são muito bons, as vozes estão muito bem entrosadas, o texto é linear e coloquial. Tudo acontece como uma história de vida, narrada ora em primeira, ora em terceira pessoa. Fatos e simples lembranças, citações, tudo remete a um período em que os jovens (pelo menos alguns) tinham mais consciência política. E, apesar do tom cinzento da vida intelectual brasileira, nos anos mais marcantes da artista, fica bem claro que, sem erguer a voz, ela se fazia ouvir.

Por isso, neste dias de mais liberdade, mas de tantas agressões a nossos ouvidos, pelo excesso de ruídos e pelo excesso de banalidade, o show Nara é um oásis. Para quem vivenciou essa época. E para quem não a vivenciou, mas que precisa e merece conhecê-la.

ONDE: Teatro Jaraguá
Rua Martins Fontes, 71 – F. 3255-4380
Centro – São Paulo – SP

QUANDO: De sexta a domingo, até final de julho de 2011

quarta-feira, 1 de junho de 2011

VOZ, VIOLÃO E ENCANTAMENTO

Adélia Issa, soprano, e Edelton Gloeden, violão, nos ofereceram, no último domingo de maio, pequenas e raras jóias musicais, às quais acrescentaram o brilho de suas interpretações. Raro foi esse evento, realizado na série Cortinas Lyricas, do Teatro Oficina, porque são poucas as oportunidades que temos de ouvir composições que vêm da Idade Média e Renascença, e ainda mais raras quando são obras compostas originalmente para voz e violão.

As peças de “tradição e folclore” – subtítulo do evento – são em inglês, em arranjos de Benjamin Britten; em espanhol, em arranjos de Robert Gehrard e de Joaquin Rodrigo, famoso por seu Concerto de Aranjuez; em francês, arranjadas por M. Seiber. As raras canções em português são harmonizadas por Fernando Lopes Graça, escritor, compositor e musicólogo português, que assessorou Béla Bartók em Portugal, quando este dedicou-se às pesquisas folclóricas em solo lusitano. Mais conhecido como escritor e musicólogo, Lopes Graça demonstrou boas qualidades em seu trabalho composicional.

O recital contou ainda com peças para violão solo, que entremearam a parte de canto. A Mazurca de Tansman e as Sevillanas, de J. Turina ,são obras fortes, que exigem técnica firme e virtuosismo ( o que Gloeden realiza com plenitude). A segunda obra, dedicada a Andrés Segóvia, com seus “rasqueados”, evoca o repertório flamenco. O violão brasileiro, que é uma tradição à parte, foi representado por Radamés Gnatalli, com sua Tocata em ritmo de samba nr 2, que exige as mesmas qualidades que as anteriores.

O argentino Carlos Guastavino, falecido em 2000, compareceu com a encantadora e nostálgica Pueblito, mi pueblo, que nos anos de ditadura foi uma espécie de hino dos exilados políticos – conforme nos informou Adélia Issa. E o brasileiro Mozart Camargo Guarnieri, falecido em 1993, foi representado pelas 3 canções brasileiras, que trazem o mesmo tom jocoso que as peças antigas: Vou-me embora, Quando embalada e Quebra o coco, menina (esta, com texto de Juvenal Galeno).
O bis não foi menos interessante: a cantiga de Natal de Ernest Mahle com texto de Vinícius de Moraes.

O perfeito entrosamento entre ambos, a bela voz e interpretação solta, leve e adequada, de Adélia Issa, e a feliz escolha de repertório deixaram o público entusiasmado. Tão entusiasmado que os aplausos emocionaram até as lágrimas a produtora do evento, Naomy Schölling. Graças ao patrocínio da Petrobras, que vem presenteando o público paulista com belos recitais, foi colocado em cena um jovem poeta, Daniel Ferreira, que, parafraseando trechos do repertório, manifestou em versos seu deslumbramento.

Um domingo feliz para todos nós. Que nos irmanamos nos aplausos... pela beleza e encantamento...pelos momentos felizes, ao som de voz e violão ...